(artigo originalmente publicado no Jornal Impacto - autor: Carlos Orpham)
Sábado, às 7 horas da manhã, recebi um telefonema da filha da Dona Júlia me informando que sua mãe tinha falecido. Dona Júlia trabalhou na casa de minha mãe quando eu ainda era solteiro. Já faz tempo. Mais de vinte anos. Não sei bem porque, mas sempre tive pena daquela mulher. Tinha uma fisionomia melancólica, triste mesmo. Tinha uma vida dura, imagino. Moradora do Bom Retiro desde os tempos em que não havia asfalto. Casa sem acabamento, sem reboco, sem piso, sem forro. Pelo menos na época em que a conheci era assim. Depois melhorou um pouco.
Há alguns anos encontrei sua filha, a mesma que me ligou, no centro da cidade e ela me falou de sua mãe. Disse que ela gostava muito de mim e que me ficou muito grata pelo fato de eu tê-la ajudado a se aposentar. Sinceramente, não me lembrava e nem ainda me lembro de tê-la ajudado nesse sentido, mas de qualquer forma fiquei feliz em saber que havia se aposentado e que usufruía de alguma renda para sobreviver.
Levantei-me, pois quando atendi o telefone ainda estava na cama, afinal, era sábado e as crianças já estão gozando de férias escolares. Tomei um banho, me vesti, tomei o café da manhã e saí para dar meu último adeus àquela mulher que me causara grande compaixão. Cheguei ao velório municipal, caixão com o corpo de Dona Júlia, filha de um lado e uma menina do outro. Lá fora o filho e alguns netos. Só. Cena triste!
Cumprimentei a parenta e falamos sobre o acontecido, a doença e os últimos momentos de sua mãe no hospital municipal. Disse-me também que o funcionário do cemitério tinha dito a ela que não havia túmulo a disposição e que isso a estava preocupando. Fazer o sepultamento no Distrito de Botafogo foi uma das soluções apontadas pelo funcionário, o que não foi aceito pela família, que queria que o enterro se desse na cidade em que ela viveu e morreu. Com razão. Despedi-me e fui embora. Depois soube que a alternativa encontrada foi pedir emprestado o túmulo de um parente para servir de última morada à pobre Dona Júlia.
Bebedouro é uma cidade problemática. E isso se deve, não só às mazelas do presente, mas aos descasos do passado. A falta de planejamento estratégico, de visão de futuro dos nossos governantes, nos trouxe uma realidade amarga. Uma cidade com um alto estoque de precatórios, o que reduz drasticamente nossa capacidade de endividamento e, por conseguinte nossa condição de tomar recursos onerosos de programas governamentais como o PAC. Ostentamos o vergonhoso título de sermos a única cidade da Bacia hidrográfica do Baixo Pardo/Grande que não trata todo seu esgoto. Pagamos caro para destinarmos adequadamente o nosso lixo e corremos o risco de não termos onde enterrar os nossos mortos. Triste realidade a nossa. Quase tão triste quanto a do velório de Dona Júlia.
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